PALESTRA: Duas versões do contextualismo radical: notas comparativas sobre a noção de contexto em J. Searle e C. Travis

Data: 19/05/2017, às 11h

Local: Sala Leandro Konder (mezanino do Auditório Padre Anchieta, acesso via escada lateral)

Prof. Eduardo Caliendo Marchesan

Pós doutorando FFLCH-USP FAPESP

Nas últimas três décadas, emergiu em filosofia da linguagem uma corrente contextualista que promoveu a releitura dos trabalhos de J. L. Austin através do desenvolvimento das intuições do filósofo de Oxford acerca da relação entre a verdade e a significação das palavras. Tal releitura procura dar visibilidade à ideia, presente de modo embrionário nos trabalhos de Austin e também de Wittgenstein, de que a determinação das condições de verdade de uma frase pode ocorrer apenas no nível de um ato de fala assertivo, como pronunciamento de uma sentença em sua inscrição histórica. Tal projeto contextualista tem sido, por vezes, equiparado à clássica leitura de J. Searle sobre os atos de fala (speech acts), de tal modo que seus representantes são listados junto a Searle como “contextualistas radicais”.

O trabalho que apresento pretende mostrar diferenças importantes entre a leitura clássica de Searle e a posição do principal nome do contextualismo emergente nas últimas três décadas, Charles Travis. Olhando de perto o modo como estes dois autores teorizam a determinação contextual das condições de verdade de um enunciado assertivo, exponho como há duas noções de contexto em jogo. No caso de Searle, o contexto é equiparado àquilo que ele chama de background assumptions que, operando como um acordo tácito entre os falantes sobre o mundo e aquilo que nele existe, faz com que o contexto se organize a partir de uma ontologia social (e natural). Assim compreendido, o contexto equivale àquilo que existe nas diferentes situações em que uma frase afirmativa é pronunciada, de tal modo que é o existente, compreendido como background assumption, que, adicionado à significação literal da frase como elemento extralinguístico, faz com que ela possa adquirir um conjunto determinado de condições de verdade. Em outras palavras, são as diferentes configurações dos fatos que compõem a realidade que determinam o que conta como verdade no pronunciamento de uma frase.

No caso de Travis, o contexto assume uma outra dimensão: são os propósitos de um falante quando este pronuncia uma frase que determinam o que conta como verdadeiro ou falso, de tal modo que, ainda que a realidade esteja organizada precisamente do mesmo modo em duas ocasiões diferentes em que o mesmo falante pronuncia a mesma frase, um ato de fala assertivo pode adquirir condições de verdade distintas, até mesmo conflitantes. Em outras palavras, o propósito do ato de fala sendo executado delimita tal ato como um tipo de ação específica, o que põe em jogo critérios normativos definindo precisamente qual tipo de ação está em questão. Não é, portanto, a dimensão factual do mundo como ele é (seja como fato bruto, seja como fato cultural ou institucional tacitamente acordado), contingente e extrínseca ao ato de fala, que determina as condições de verdade de uma asserção, mas as normas que caracterizam um tipo de ação como tal que colocam em jogo os critérios que definem o que pode ser verdadeiro ou falso numa ocasião específica.

Trata-se, assim, de dois modos de entender o legado da filosofia de Austin e da filosofia da linguagem ordinária de modo geral, cuja diferenciação permite, não apenas considerar o real animus dessa filosofia, mas avançar o problema sobre a verdade e a determinação contextual de suas condições.

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